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Neiva Alves Ribeiro

Psicóloga Clínica Especialista Em Teoria Cognitivo Comportamental

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O ISOLAMENTO
O tema isolamento, desde cedo, faz parte de meus questionamentos internos e externos. Tenho acompanhado várias situações onde o isolamento é mantido como forma de estruturar o tempo, sendo o ato de isolar-se a única opção possível.

INTRODUÇÃO

O tema isolamento, desde cedo, faz parte de meus questionamentos internos e externos. Tenho acompanhado várias situações onde o isolamento é mantido como forma de estruturar o tempo, sendo o ato de isolar-se a única opção possível.

Sem a consciência de que isolar-se é sofrimento, o indivíduo repete o ato, como refúgio para os anseios e necessidades de contatos não satisfeitos.

No Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, temos que:

Isolamento, s.m: separação; interceptação de corrente elétrica, segregação; (Psiq.) mecanismo neurótico de defesa, que consiste em reduzir ao máximo as estimulações exteriores; acompanha-se de irritabilidade, ansiedade, diminuição temporária da eficiência intelectual e, freqüentemente, de alucinações visuais. (Dicionário Escolar da Língua Portuguesa – Ministério da Educação e Cultura – Fename – Francisco da Silveira Bueno, 1975).

Uso um exemplo, a seguir, de um caso clínico.[1]

Trago ao papel e aos olhos do leitor, o relato do Augusto, que há algum tempo da minha jornada profissional, me concede o privilégio de viver e ouvir sua dor.

Ele diz que o refúgio se faz numa nave espacial, nave esta, construída em seus devaneios infantis, em torno de seus cinco anos de idade. Relata que a nave tem todo o necessário para viver dentro dela, sem que seja preciso sair da mesma para nada. Lá dentro possui armários, brinquedos, botões que comandam tudo; enfim, ele pode navegar pelo espaço e, de dentro da sua sabedoria infantil, pensa estar pleno, sendo esta a forma potente para resolver seus problemas afetivos, bem como suas necessidades de contato.

Porém, vida afora, ele segue dentro desta nave, que navega pelo espaço na ilusão de nada precisar. Do interior da nave, apenas percebe a imensidão sideral; está sozinho, não tem o calor da mão humana, o olhar do outro; está profundamente “isolado” como forma ou recurso de não se deparar com a dor da necessidade que teve que negar, e a decisão que resultou desta negativa.

Quando Augusto chegou para tratamento, tinha 25 anos de idade e uma aparência de estar bem. Tinha curso superior, sua vida estava constituída ao lado de uma parceira e a situação financeira era boa. Porém, referia estar sempre aborrecido; esta palavra aborrecimento era trocada de quando em vez por um desconforto que não levava nome, sendo desconhecido para ele o que sentia.

Augusto passava a sensação de estar adaptado ao vazio que era sua vida, suas emoções pareciam amortecidas, e grande parte do seu dia era vivido no deslocamento entre sua casa e seu trabalho, pois nesta ocasião morava em uma cidade vizinha de Porto Alegre.

Porém, era nos finais de semana que o desconforto ou aborrecimento se faziam presentes, sendo então a queixa principal, pois Augusto não sabia como estruturar o tempo, recorria a TV ou ao computador e ali ficava perdido diante da tela; às vezes, tinha consciência que o mundo corria lá fora, sem ele, mas logo a seguir a esta consciência, parecia adaptar-se ao contexto de solidão. Muito embora a queixa fosse de desconforto, havia um anestesiamento da emoção, uma preferência por estruturar o tempo, quando não estava trabalhando, no isolamento.

Muriel James (1988), falando do isolamento diz:

Quando as pessoas se isolam fisicamente dos outros, podem fazê-lo por necessidade (ir para o trabalho) ou por escolha (para estar com alguém ou ficar sozinhas para pensar ou descansar, etc).

Quando as pessoas se isolam psicologicamente, estão física mas não emocionalmente presentes. Podem estar fantasiando, sonhando acordadas, amuadas, mergulhadas em auto piedade ou planejando um projeto. Podem balançar a cabeça quando outra pessoa fala, até mesmo responder de maneira incoerente sem ouvir o que está sendo dito (JAMES, 1988).

O presente estudo tem por objetivo demonstrar o que acontece nas relações quando as pessoas usam a estruturação social do tempo no isolamento como forma possível de se colocar no mundo, bem como as decisões e estratégias, na estrutura da personalidade, que determinam essa escolha.

Estruturação Social do Tempo

As pessoas podem estruturar seu tempo de 6 (seis) formas. Elas podem passar horas em isolamento, mesmo na presença de outras pessoas, ou cumprindo rituais, ou mesmo em atividades variadas. Às vezes, jogam jogos psicológicos ou se envolvem em passatempos ou se permitem ter intimidade.

Há quatro classificações básicas para a estruturação do tempo a curto prazo no comportamento social humano, com dois casos limitantes. Se duas ou mais pessoas encontram-se juntas em um recinto, elas têm seis tipos possíveis de comportamento social à sua escolha. Num extremo o caso limitante é o isolamento, no qual as pessoas não se comunicam abertamente uma com a outra. Isto poderá ocorrer em situações tão diversas quanto um trem subterrâneo ou um grupo terapêutico de esquizofrênicos retraídos.

Em seguida ao isolamento, no qual cada pessoa permanece envolta em seus próprios pensamentos, a forma mais segura de ação social é constituída pelos rituais. Estes são intercâmbios altamente estilizados que poderão ser informais ou formalizados em cerimônias que são completamente previsíveis [...]

[...] A forma seguinte mais segura de ação social é conhecida como atividades, que consiste no que chamamos comumente de trabalho. Aqui as transações são programadas pelo material com o qual se trabalha, seja madeira, concreto ou problemas aritméticos. As transações de trabalho são tipicamente Adulto-Adulto, orientadas para a realidade externa, isto é, assunto da atividade. Na ordem seguem-se os passatempos, que não são estilizados e predizíveis quanto os rituais, porém possuem uma certa qualidade repetitiva, do tipo e intercâmbios de escolha múltipla e de complementação de sentenças, como as que acontecem nas festas, onde as pessoas não se conhecem muito bem [...]

[...] Jogos são conjuntos de transações ulteriores, repetitivas por natureza, como um desfecho bem definido. Numa transação ulterior o agente finge estar fazendo uma coisa, quando, na realidade, está fazendo outra, pois todos os jogos envolvem uma isca. Esta só funciona, entretanto, se houver uma fragilidade na qual possa enganchar, uma brecha ou fraqueza no interlocutor da qual possa aproveitar, como o medo, a ganância, o sentimentalismo ou a irritabilidade. Enganchado o “alvo”, o jogador aciona uma espécie de mudança para obter o desfecho. A mudança é seguida por um momento de confusão ou perplexidade, enquanto o alvo entende o que aconteceu (BERNE, 1991).

[...] A intimidade é uma franca relação Criança-a-Criança sem nenhum jogo nem exploração mútua. È instaurada pelos estados. Adultos do ego das partes envolvidas, de modo que entendem muito bem seus contratos e compromissos recíprocos, algumas vezes sem se proferir uma única palavra sobre esse assunto. Quando se torna mais claro esse entendimento, o Adulto gradualmente sai do cenário, e se o Pai não interfere, a Criança se torna cada vez mais descontraída e livre. As transações íntimas de verdade acontecem entre dois estados Criança do ego. Mas o Adulto ainda permanece ao fundo como observador para assegurar a manutenção dos compromissos e limitações. O Adulto também tem a tarefa de manter o Pai longe para que não se meta nem estrague a situação. Na verdade a aptidão para a intimidade depende da capacidade do Adulto e da Criança para manterem o Pai à distância se for necessário mas é ainda melhor se o Pai benevolentemente der permissão ou, melhor ainda, encorajar o relacionamento. O encorajamento Parental ajuda a Criança a perder o medo da intimidade e lhe assegura que não sofrerá restrições por uma acusação ou ameaça de culpa (BERNE, 1988).

Das 6 (seis) formas citadas por Berne como estruturação social do tempo, Augusto refere com uma freqüência maior 2 (duas) delas, o isolamento e a atividade. Tanto em sua vida familiar, quanto no trabalho, como em sua relação de par, em muitos momentos ele escolhe ficar só e, em tantos outros, o desfecho das transações é entrar em isolamento.

Uma vida em isolamento

É possível que Augusto, desde o útero, já tenha se deparado com a dor do isolamento; conta ele que, durante a gravidez, a mãe permaneceu em sua cidade natal, enquanto o pai era transferido a trabalho para um estado próximo, sendo que Augusto desconhece qualquer depoimento da mãe no sentido de ouvir as emoções dela a este respeito.

É ainda na infância que a dor maior se instaura, na medida que o pai é pessoa bastante rígida e não permite que o menino tenha acesso, por exemplo, ao computador, que Augusto refere como o brinquedo onde era possível fazer joguinhos, sendo sua brincadeira preferida, mesmo quando muito pequeno. O pai desconhecia esta preferência de Augusto e sempre que podia, lhe dizia que o computador era para trabalhar e que se Augusto insistisse em usar o aparelho, poderia estragar. Neste fato, o pai de Augusto também não sabia que o filho via o aparelho como um brinquedo que ele, pai, podia mexer e brincar à vontade e, que outras pessoas, não poderiam compartilhar suas coisas.

Relata ainda Augusto: “não lembro de assistir a uma partida de futebol com meu pai, nem sequer participar da escolha de um carro novo, quando esta compra ocorria”. (SIC)

A mãe também era pessoa rígida e com dificuldades para expressar afeto. Augusto não relata ter conhecido o colo, o sorriso e o calor de nenhum dos pais em situações de intimidade e ternura.

Conta que, aos dois anos de idade, quando a irmãzinha nasceu, acordou e percebeu que todos haviam sumido; quando o pai apareceu, foi para levá-lo ao hospital afim de que ele pudesse conhecer a irmã. Nos anos a seguir, ele lembra que cada um ficava no seu quarto, papai, mamãe e sua irmã; lembra de, às vezes, sair do quarto e dirigir-se à sala para contar algo e ser repreendido por importunar o pai e a mãe nas respectivas leituras ou mesmo porque assistiam TV.

Augusto viveu um processo onde, desde cedo, suas necessidades básicas não foram atendidas; é possível que o feto tenha entrado em sofrimento desde a vida uterina. Em tenra idade, o bebê teve que lidar com todas estas questões negando e reprimindo suas necessidades emocionais. Na medida em que construiu seu mundo de fantasias, único e isolado, com a decisão de “abastecer-se”, “nutrir-se” num contexto imaginário[2], ele também renegou a consciência dos diversos mundos solitários e únicos de cada membro daquela família como forma de estar enquadrado àquele meio.

Interessante lembrar que, ao mesmo tempo que renegou, “optou” inconscientemente por viver esta contrariedade, transformando-a numa decisão de sobrevivência, pois, para estar com todas aquelas pessoas e ser aceito por elas, ele precisou renegar seus anseios de contato e sequer pode trazê-los à consciência.

No livro “Como estar bem” de J. J. Tápia encontramos que:

A partir do momento que foi concebido, talvez antes, e essencialmente desde que nasceu, uma nova e irreproduzível maneira de sentir, atuar, reagir, pensar, etc, chegou a este pequeno, mas palpitante, mundo de luz. Se bem que haja em você aspectos que, por sua pele, origem, suscetibilidade a reações e fisiologia, partilha com os demais seres humanos, na verdade, como indivíduo, você é uma totalidade, uma gestalt que o torna particular como ser único e indivisível.

Você também deve se conscientizar de que, sob este aspecto duplo de indivíduo e de ser humano, em momento algum pode prescindir de tomar como referência os demais seres humanos que dividem com você este planeta solar.

Seu ser só toma sentido e corpo no contato com a natureza, mas fundamentalmente no contato com os outros. Todos os seus limites, desde sua pele até suas condutas, na realidade são órgãos para fazer contato, reconhecer, tocar e, por que não, AMAR os demais. Mas, simultaneamente, para ser contatado, reconhecido, tocado e amado.

Esta totalidade que hoje você é constitui o resultado natural e universal de que, desde o momento crucial em que respirou pela primeira vez com seus pulmões e em seu coração foi bombeado o primeiro jorro de sangue oxigenado, você conseguiu satisfazer a toda uma série de necessidades básicas das quais não pode descurar-se sem sofrer conseqüências perigosas (TAPIA, 1979).  

Penso que já na história de vida uterina, onde a percepção do indivíduo se faz de forma rudimentar, Augusto provavelmente sentiu este espaço como frio e pouco acolhedor. Já ao longo do desenvolvimento infantil e com o amadurecimento do aparelho perceptivo, este menino possivelmente tenha tido dificuldades para ver principalmente a figura da mãe por inteiro. Já foi mencionado neste trabalho a ausência do sorriso e do calor do colo desta mãe  por ele, Augusto. Prossegue, o mesmo, relatando a ausência de manifestações das emoções dela, mãe, durante a gravidez de Augusto, quando não pode contar com a presença do marido.

Quero aqui salientar que hoje as relações de par são estabelecidas de forma simbiótica, demonstrando a dificuldade que a criança teve para elaborar o processo de separação e individuação com a mãe.

Esta questão é melhor entendida quando Augusto refere a relação com a noiva e o sofrimento dele, tendo que ligar várias vezes ao dia para ela, obtendo a opinião dela, noiva, mesmo em questões que só dizem respeito a ele.

Para sobreviver naquele meio ele, criança, precisou de estratégias criadas num mundo de sabedoria infantil, no qual tudo se resolve em fantasias. O A1 (Adulto da Criança) criou um mundo mágico, isolado do contexto e continuou enganado, pensando que a fantasia do mundo infantil lhe traria satisfações e, com isto, no P1 (Pai da Criança) decidiu pelo isolamento como forma de satisfação das necessidades de ser acariciado e amado.

Segundo Petrúska Clarkson

      [...]” Clientes, por exemplo, relatam:”Era melhor quando ele batia em mim pelo menos eu sentia que existia para ele depois de meses durante os quais era ignorado. Para a maioria, mesmo uma briga violenta é melhor do que ser condenada ao ostracismo. Mesmo os criminosos insensíveis preferem agüentar todo o tipo de castigo físico a ficarem confinados em solitárias. Isto amplia a importância do valor social das carícias e suporta alguns exemplos clínicos, onde os relacionamentos destrutivos são aceitos (e mantidos às vezes contra toda a lógica) para evitar o vácuo fantasiado de carícias””. (CLARKSON, 1992).

Augusto, na infância, quando estruturava seu tempo com a intenção de brincar, conta:      “ eu

 ficava várias horas sozinho em meu quarto mexendo com jogos de montar pequenas peças plásticas, que iam formando casas, palácios, legiões de soldados, tanque de guerra, cavalos, mocinho, bandido, pontes, edifícios, enfim, dava forma ao que imaginava. Estes momentos se repetiam dia, após dia, mudava o cenário a ser montado, pois a história imaginada, por mim, também se modificava. Porém, após criar uma história, um cenário, eu não brincava com a minha criação, ao contrário, me desinteressava, o sentido parecia ser o ato da montagem, a curiosidade se fazia em, unir as peças umas as outras e ter um resultado”

.Na verdade, ele tinha a intenção de brincar, mas, como entrava em isolamento, ele não tinha com quem brincar, perdendo desta forma o interesse pela brincadeira.

O isolamento na área profissional: uma repetição do mundo infantil

Augusto iniciou suas atividades profissionais como estagiário, enquanto terminava o curso superior, sendo efetivado por ocasião de sua colação de grau.

Relata que sempre teve boa relação com seu patrão, até que este se aposentou, passando a responsabilidade e propriedade do escritório para seu filho.

A partir da troca e posse do novo dono, no local de trabalho, Augusto começou a viver um conflito, que era descrito por ele como aborrecimento, pois percebia o patrão como pessoa com dificuldades para expressar suas opiniões claramente. Relata também que este distribuía as tarefas de uma forma que terminava causando problemas na equipe de trabalho.

Neste mesmo local, ainda contavam com a presença de mais uma pessoa que, na ordem hierárquica, tinha a mesma função e grau de importância de Augusto; mesmo assim, reiteradas vezes, o colega foi descrito como pessoa competitiva, capaz de fazer com que suas idéias e decisões prevalecessem  sobre as de Augusto.

Não raro, faziam reuniões de trabalho a fim de darem andamento na tarefa, sendo estes momentos descritos por Augusto como insatisfatórios, na medida que pouco ou nada falavam do conflito que eram as relações dos três, e o que precisava ser melhorado entre eles. Ao término destas reuniões, Augusto relata que ía para sua sala insatisfeito, pensando no que deveria ter dito, mas sentindo-se incapaz de voltar lá e dizer o que precisava, sendo que, após, caía num vazio onde não tinha a consciência do que exatamente o aborrecia, lidando então com a situação conflitante isolando-se em sua sala e brincando no computador.

Augusto, neste momento de sua vida, era contaminado pelo seu estado de ego Criança que impedia que o estado de ego Adulto pudesse tomar conta da vida profissional, executando a tarefa e fazendo suas expressões e idéias serem ouvidas. Na vida profissional estava evidenciando-se a decisão e a estratégia de sua Criança em manter-se isolado, com a fantasia de que assim tudo iria ser resolvido, tal qual era em sua infância, quando a falta de expressão do amor existente, na casa de seus pais, determinava que cada um fosse para o seu quarto, em isolamento, evitando lidar com a dor do frio e do vazio afetivo entre eles.

A conseqüência desta falta de amor é sua predisposição a envolver-se em situações nas quais sempre termina completamente confuso, sem saída, isolado, em que você está mal e tudo ao seu redor também está mal. Procura demonstrar a todos, por desesperança e repulsa, que ninguém pode ajudá-lo porque não crê nisso e porque, ainda que não creia, não terão o poder de tirá-lo de problemas ou estados para você insolúveis.

   Na realidade, tudo isso deriva de que seu Pequeno Professor, tomando como geral uma experiência parcial, decidiu a maneira de sobreviver atuando sempre sob uma premissa fundamental, que não é mais que uma das quatro fantasias básicas: a de que ‘as pessoas podem fazer-me sentir mal com o que fazem ou com o que dizem’. Esta perspectiva louca, a partir da qual você vive e interpreta a vida desde menino, levou-o a viver uma indecisão constante, vivenciando frente a cada situação um sentimento de derrota e fracasso completos. A solidão será a companheira habitual de suas condutas, junto ao sentimento de não ser querido e amado, levando-o ao isolamento, rejeição e desespero durante a maior parte dos dias de sua vida (TAPIA, 1979).

O isolamento na relação de par

Conta Augusto que foram duas pessoas que passaram por sua vida de forma mais significativa. A primeira namorada é descrita como uma mulher muito bonita pela qual ele se sentia atraído. Foi com esta moça que ele teve sua primeira relação sexual, que relatou como um momento difícil para ele. Conta que estava muito nervoso, era muito tímido e retraído. Este namoro era mantido de uma forma na qual não estavam, com freqüência, juntos e, aos poucos, a relação foi esfriando até acabar.

Já com sua segunda namorada, ele diz ter sido apaixonado; relata que no primeiro ano de namoro, ficavam juntos aos finais de semana na casa dela e era muito prazeroso. Passado este primeiro ano, a moça foi transferida para o interior, o que exigia que Augusto viajasse todos os dias para Porto Alegre com o propósito de  trabalhar. Os encontros do casal eram somente à noite, mesmo morando juntos. Alguns meses depois, a moça foi transferida por necessidade profissional para ainda mais longe, o que determinou  que eles comprassem um apartamento que seria do casal quando casassem. Augusto, então, passou a morar no apartamento em Porto Alegre e a noiva ficou na referida cidade.

Augusto relata que, nesta época, começou entre eles um movimento onde os encontros eram dificultados pela distância entre as cidades; às vezes não se viam, ou viajavam para ficar juntos, acontecendo muito sexo, ou ficavam juntos e cada um ficava lidando com suas tarefas de trabalho. Ele lembra de precisarem muito um do outro, como se fosse uma dependência; ele também refere que precisava muito cuidar dela; se saiam, ele fazia questão de pagar as contas sozinho, cuidava do seguro do carro dela, fazia o imposto de renda, e ela o procurava muito durante a semana para queixar-se, ou do trabalho, que ela estava achando estressante, ou para pedir que ele resolvesse situações surgidas que demandavam providências. Ao mesmo tempo, Augusto se via demasiadamente preocupado se ela saía à noite, ou quando chovia, ou mesmo se estivesse frio, temendo que algo de ruim acontecesse a ela.

Fica evidente a dor para se relacionar com a mulher pela qual ele referia ser apaixonado e estar amando. Os momentos de intimidade apareceram nos primeiros anos de namoro, enquanto viam-se em finais de semana; no contato diário; a intimidade deu lugar a zelos e cuidados excessivos.

Quando foram morar juntos, a relação que se estabeleceu com a moça foi simbiótica, tal qual a que teve na infância com sua mãe. E neste contexto se deparou com a limitação de entregar-se para o amor e o sexo. Estes atos foram vividos por ele sem a consciência do que representaram, ao mesmo tempo que ele faz referência da insatisfação que sentia pela forma de relacionar-se com a mulher amada.

A frustração era consciente; o comportamento e o desfecho é que eram inconscientes, pois ele isolava-se na fantasia de que, estando só, tudo iria melhorar. Tinha, com isto, que negar suas necessidades de afeto e contato, por não ter autonomia para pensar outras possibilidades de atender suas demandas.

Schiff define simbiose como:

 “é uma sensação de insegurança ou inadequação no presente, que está relacionada diretamente com o passado não solucionado e com o futuro desejado, porém incerto”.

...” Inicialmente, um bebê necessita da simbiose para sobreviver e a sobrevivência permanece equiparada até certo ponto com alguns aspectos não solucionados da simbiose. Para atender às necessidades que estão relacionadas com os remanecentes da simbiose, as pessoas continuam a agir mais tarde na vida, em relação aos outros, como o faziam nos relacionamentos originais, pois não tem consciência de outras opções possíveis. Por conseqüência, selecionam ativamente pessoas que se relacionarão com elas de forma semelhante e tentam obter daquelas que espontaneamente não fariam isso, a mesma forma de relacionamento (SCHIFF,  1986).

Conclusão

Acabamos de ler a história de uma pessoa que estrutura seu tempo social em isolamento e, em muitos momentos, preenche seu tempo de vida ficando só.

A percepção dos momentos vividos ainda em vida uterina é marcada pela batida de um coração de quem teve sua gravidez sozinha, sem a presença do companheiro para acompanhá-la e dar-lhe o apoio que toda a mulher necessita neste período de sua vida.

Já nos primeiros anos do desenvolvimento infantil, lembra de ter o carinho da mãe em situações ritualizadas. Já o pai, a lembrança que traz para a vida adulta, é de alguém que não brincava, não sabia dividir suas coisas com outras pessoas e também passava seu tempo de vida sozinho, ou mesmo preferia o isolamento como a única opção possível, não podendo, desta forma, mesmo junto da mulher e do filho, desfrutar destas companhias.

A influência parental determinou uma estratégia e uma decisão, levando a criança a isolar-se como única forma possível de sobreviver num mundo que era baseado em falta de carícias e contato.

Ao mesmo tempo que esta criança teve que fantasiar para criar o remédio que lhe traria “alívio” para o sofrimento de estar abandonada, precisou viver sem dar-se conta do abandono, e tendo também que negar a dor do seu engano.

E, para finalizar, penso que, ampliar o nível de consciência daquele que vive em isolamento, acreditando que esta é a forma de resolver necessidades não atendidas, significa facilitar que ele perceba o engano que sua Criança um dia teve que viver. Ele, menino, precisou enganar-se para não se deparar com um papai e uma mamãe que, mesmo presentes fisicamente, não podiam lhe oferecer e ensinar a fazer contato.

E depois, a continuidade da ampliação desta consciência, vai dar lugar a outras opções de afetos para serem vividos, com o preenchimento do vazio do peito e a presença nutridora do outro na vida. Isto é intimidade.

A consciência, a ação para buscas afetivas e a intimidade promovem a autonomia do indivíduo que se liberta da dor de um Script de ISOLAMENTO com a mais eficaz saída: FAZER CONTATO.

Referências Bibliográficas

  1. ALLEN, James. Biologia e análise transacional II: um apanhado analítico sobre neurodesenvolvimento. Revista Brasileira de Análise Transacional.- Órgão Oficial da UNAT – Brasil.AnoVII, junho/97, Ano VIII, junho/98. 
  2. ALLEN, James. Biologia e análise transacional: integração de uma área negligenciada. Revista Brasileira de Análise Transacional.- Órgão Oficial da UNAT – Brasil.AnoVI, n.1
  3. BERNE, Eric  O que você diz depois de dizer olá? A Psicologia do destino. Tradução: Rosa R. Krausz. São Paulo: Nobel, 1988.
  4. ______. Análise Transacional em Psicoterapia. Tradução de Lúcia Helena C. Zabotto. São Paulo: Summus editorial, 1985.
  5. ______. Prêmios Eric Berne. Prêmios Eric Berne. Belo Horizonte: Rev. Caum. 1999.
  6. ______. Princípio do Tratamento de Grupo – ITAA (Associação Internacional de Análise Transacional) Califórnia, 1965.
  7. ______. Sexo e amor. Tradução de Pedro Lourenço Gomes, 2. ed, Rio de Janeiro: José Olympio, 1988.
  8. CLARKSON, Petüsca. O campo interpessoal em análise transacional.  Revista Brasileira de Análise Transacional.- Órgão Oficial da UNAT – Brasil.Ano, n. 1, out/93. 
  9. JAMES, Muriel; JONGEWARD, Doroty. Nascido para vencer: Análise Transacional com experiências Gestalt. 15. Ed., Brasiliense, 1986.
  10. JAMES, Muriel; SAVARY, Louis. Um novo Eu: Autoterapia pela análise transacional. Tradução de José Araújo Silva. São Paulo: Ibiara, 1982.
  11. STEINER, Claude. Os papéis que vivemos na vida: Análise transacional de nossas interpretações cotidianas. Tradução de George Schlessinger, Rio de Janeiro: Arte Nova, 1974.
  12. STEINER, Claude; PERRY, Paul. Educação emocional: um programa personalizado para desenvolver sua inteligência emocional. Tradução de Terezinha Batista dos Santos. 3. ed. Objetiva Ltda, 1997.
  13. TAPIA, J. J. Como estar bem: uma estratégia de vida pela análise transacional. Brasiliense, 1979.

[1] Os dados citados tem o consentimento do cliente; o nome é fictício para preservar o sigilo.

[2] Como citado na introdução do presente trabalho quando é usado o exemplo da Nave Espacial.

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